terça-feira, 17 de julho de 2012

Relato de caso... vale a pena ler...

A mulher tinha 30 anos, um filho, um ótimo salário, um marido bacana, uma empregada de confiança, uma folguista maravilhosa, uma rotina enlouquecida e uma babá de quem desconfiava. Resolveu, por isso, instalar câmeras em casa. Descobriu assim que a verdadeira babá do filho de 2 anos era a televisão. Ligada o dia todo, a TV entretia o menino até a exaustão. Sentada diante do computador, e acelerando as cenas em alta resolução das câmeras escondidas na sala e no quarto da criança, a mulher se diluía em raiva e garotinho. Assistir ao próprio filho alternando seu tédio entre o sofá, o chão e a parede, quando não estava em pé colado na tela, foi devastador. Abandonado na própria inocência, o menino quieto apenas sorria quando aparecia alguém.

A babá flagrada pelas câmeras era uma presença esporádica, quase incidental, na rotina da criança, enquanto pai e mãe trabalhavam fora. E quando estava por perto, conversava no celular. As câmeras não tinham som, mas não parecia haver gritos, cenhos franzidos, nada disso. Ao prepará-lo para dormir, ela até parecia carinhosa, mas no restante do dia o ignorava. Mesmo assim, dividia com ele o quarto, em paz, enquanto a mãe ficou se perguntando se a moça atendia aos chamados noturnos, ou se também os ignorava.
Chateada, a mãe demitiu a babá e resolveu botar o filho na creche, em tempo integral. Passada a difícil adaptação da escolinha, acostumou-se a buscar o filho pronto para dormir, na volta do trabalho. Parecia perfeito. Ele estava finalmente entretido por profissionais da educação, gente que jamais o abandonaria daquela forma. Manteve apenas a folguista dos fins de semana, moça de confiança, contratada desde o primeiro dia de vida do filho. Nessa, sim, ela confiava, até porque podia fiscalizar, sem aviso prévio, o expediente da moça, aos sábados, domingos e feriados. Aposentou as câmeras.
Não demorou muito, a dúvida voltou a incomodar. Mãe escaldada, achou melhor religar as câmeras e dar uma checada na folguista. Vai que…O trauma recente não a deixava em paz. Tinha pesadelos com o filho sendo engolido por uma televisão. O filho sozinho, chorando, querendo ajuda, sem ninguém atender.
No primeiro fim de semana, não viu nada que chamasse sua atenção. A folguista brincava com a criança. Sentava no chão, montava cabanas e legos. No segundo fim de semana, tudo ok novamente. Respirou aliviada e sorriu ao ver o menino correndo de índio pela casa, sendo arrastado pela folguista em cima de um cobertor como se fosse charrete. Riu. Nunca tinha visto aquela brincadeira. Onde estava mesmo naquele sábado?
No terceiro fim de semana de monitoramento, ficou enternecida ao ver o filho brincando no chão da sala de TV, enquanto a babá comia com um prato no colo e comentava algo que passava na televisão com ele. Onde eu estava, ela se perguntava, porque era domigno, e domingos são dias cheios, tomados por festas e passeios, aos quais sempre compareciam, a família, a folguista…Ficou um pouco enciumada ao perceber que o filho toda hora abraçava a folguista, beijava o braço, puxava pela mão, meio grudento demais. Ele não era assim. Ou era?
No quarto fim de semana, a ficha caiu. Sentada diante do monitor do computador à procura de imagens com provas contra a desatenção eventual da folguista, ela finalmente percebeu que havia algo muito errado na rotina do menino. Um vazio, uma solidão e um abandono não registrados em imagem alguma, mas na ausência de registros. A presença esporádica e quase incidental na vida do próprio filho era ela, a mãe, uma imagem que entrava e saía do alcance das câmeras em minutos fugazes durante todo o dia. Diante da descoberta, chorou um choro diferente, um choro sem consolo, que não se resolveria ao demitir alguém.
Mas, logo lembrou, ela trabalhava demais, mal tinha tempo para si: horário a cumprir, clientes cobrando respostas, marido cansado. Os fins de semana acabavam tomados por compromissos, necessidades, compras. Mal relaxava. Ela se sentia culpada porque gostaria de ser mais presente. Gostaria? Mas não tinha como, ela fazia o possível. Fazia? Deixava ordens escritas, telefonava para casa, até filmar, filmou, e finalmente se enxergou. As câmeras se transformaram no espelho que ela não ousava encarar.

6 comentários:

  1. Ei Carla!!
    Que ótimo texto para reflexão..Eu ainda não tenho filhos mas fico pensando eu saio de casa as 05:00 da manhã e só chego depois das 20:00..se tivesse um filhinho agora eu sairia com ele dormindo e talvez quando eu chegasse ele também já estivesse dormindo e ai vem a preocupação.deixar com quem???
    Mas as vezes nos preocupamos tanto com coisas externas que esquecemos qual é a nossa parte!!!
    Vou guardar este texto!!
    beijos e uma feliz quarta feira!

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  2. Que triste!
    EU jamais troquei meus filhos pelo trabalho. Quando vi que o trabalho iria me engolir, resolvi parar de trabalhar, apertar as coisas aqui em casa e aproveitar os melhores e mais importantes momentos deles que precisavam da mãe do lado.
    O texto é ótimo para muitas mães por ai...
    Um beijo

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  3. OI PASSANDO PARA PARABENIZAR POR ESSE TEXTO,TENHO 2 FILHOS E MES QUE VEEM VIRA O 3 ...PASSAMOS POR ISSO MESMO,MAS DEUS AJUDA!!!
    PARABENS....

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  4. uau, realmente faz a gente refletir! Eu amo o tempo que passo com meus filhos, não trocaria isso por salário nenhum :)
    Bjs

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  5. Belíssimo texto Carla, para refletir mesmo.
    Bom começo de semana!
    :D

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  6. é... nessa vida em que vivemos achamos que esta tudo certo , tudo correndo muito bem e procuramos defeitos em outros, devemos sim parar, pensar e nos olharmos no espelho interior antes mesmo de prejulgar alguém, devemos mesmo é parar e refletir se é só o dinheiro que traz felicidade, ou bons momentos com nossa família que é o mais importante, nao adianta ter tanto e esquecermos de nossa própria família, de quem vive ao nosso lado.

    uma boa reflexão esses post!

    bjus Carla.

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Agradeço pela visita e o carinho,bjinhos...

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